Mudanças

 

Nascemos frágeis, ignorantes e completamente dependentes de terceiros. Antes mesmo de termos consciência de nossa própria existência, o ambiente em que estamos inseridos começa a nos moldar. Essa influência precoce se perpetua e se transforma na primeira regra silenciosa que aprendemos a seguir. Tornamo-nos dependentes de costumes, padrões e acontecimentos que nos cercam, predispostos a aceitar o que nos é imposto sem questionamento. E quando ousamos questionar, o fazemos de forma superficial, sem convicção.

Aos poucos, somos moldados por tudo: o que comemos, o ar que respiramos, as palavras que ouvimos, os gestos que presenciamos. Cada elemento do cotidiano atua como um cinzel invisível, esculpindo nossa percepção e nossa identidade.

Na infância, lutamos para nos mover, ficar de pé, caminhar. À medida que nossos corpos evoluem, nossas necessidades mudam. Aprendemos a falar, a compreender o mundo à nossa volta. Quando chegamos à escola, já carregamos uma bagagem essencial para a convivência coletiva. É ali que temos nossa primeira experiência em sociedade, longe daqueles que garantiam nosso bem-estar.

O que nos motiva a estudar, porém, raramente é o desejo genuíno de aprender. Somos guiados por regras externas, por uma ideia imposta de que a escola é um caminho obrigatório para garantir um futuro que ainda não compreendemos. Aceitamos essa realidade como um fardo, carregado tanto na dependência dos pais quanto na fase em que assumimos responsabilidade por nós mesmos.

Nesse mesmo período, surge a necessidade de pertencimento. Queremos nos encaixar, ser aceitos. Para alguns, os laços criados nessa fase sustentam a vida adulta. Para outros, são apenas memórias a serem esquecidas.

Com o tempo, escola e trabalho passam a coexistir, injetando uma dose pesada de responsabilidade em nossas rotinas. Perdemos o controle sobre nossas vidas, aprisionados por tarefas e obrigações. O descanso se torna raro, e quando finalmente podemos colher os frutos de anos de dedicação, já estamos exaustos. A vontade de evoluir se esvai, e nos acomodamos com o simples.

Mas então surge o espírito de rebeldia. Sentimos que tudo aquilo que nos foi imposto se torna insuportável. Jovens, acreditamos em uma falsa independência. Buscamos grupos com os quais nos identificamos, mas acabamos presos às regras deles, criando novas dependências. Tudo parece pronto e previsível, mas ao mesmo tempo errado e desconfortável.

Quando finalmente percebemos que nossa forma de pensar estava equivocada, já estamos dominados por essa metodologia. Ir contra ela parece desgastante e desnecessário. Ainda assim, compreender e questionar as regras é essencial para continuar evoluindo. Em algum momento, precisamos decidir por nós mesmos. Nossa voz precisa soar mais alto que o ambiente e os grupos. Infelizmente, essa fase é breve, logo substituída por outra mais duradoura e quase definitiva.

Com o tempo, desenvolvemos uma habilidade peculiar: justificar nossos atos, especialmente nossos fracassos. Tornamo-nos tão hábeis nisso que convencemos a nós mesmos de que somos felizes. Talvez tenhamos mais do que nos é de direito, mas o sentimento de que poderíamos muito mais nos corrói. Às vezes, tomamos decisões que destroem tudo o que levamos anos para construir. O que poderia ser o início de algo novo se transforma apenas no fim de algo velho. Sem o ímpeto da juventude, reinventar-se torna-se quase impraticável.

Entretanto, há aqueles que se adaptam às mudanças, que questionam tabus, que vivem segundo seus próprios conceitos e valorizam o que realmente importa. Esses não se arrependem. Não se deixam derrotar pelas intempéries da vida. Não temem quebrar regras ou romper com rotinas infelizes.

Esses indivíduos podem se orgulhar da vida que levam. Possuem discernimento sobre o que é possível, o que é válido e o que precisam fazer para se sentirem realizados. São os que sobrevivem ao tempo, às tragédias e aos males que destroem a maioria das pessoas.


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