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Devaneios de consciência

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  Eis que sentimos a angústia de quem perde um ente querido. A dor da impotência invade o corpo quando tentamos, em vão, reverter o inevitável. O ar parece insuficiente para encher os pulmões, enquanto as paredes se fecham como se quisessem nos esmagar. Sufocamos à espera de uma morte que nunca chega, como se ela fosse a única libertação possível. A mente nos trai. O que vemos não é real — ou talvez seja, mas não conseguimos compreender. Estamos expostos à própria sorte, cada vez mais falha, cada vez mais traiçoeira. Buscamos refúgio em músicas antigas, em lembranças distantes, tentando extrair algum prazer que justifique uma existência tão dolorosa. Tentamos estreitar os poucos laços que temos, na esperança de que alguém compartilhe nossa dor. Valorizamos o que não importa, apenas para dar sentido aos dias de agonia. Fantasiamos uma vida melhor, mesmo sabendo que essas ilusões duram pouco. E quando se desfazem, nos resta apenas o vazio. Nossas vidas tornaram-se bizarras. Somos car...

Enxergando o óbvio

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  Uma das maiores dificuldades do ser humano é enxergar o óbvio. Talvez aí resida a origem de grande parte de seu sofrimento: a necessidade de complicar, fantasiar e distorcer aquilo que está diante dos olhos. É raro encontrar alguém com uma linha de pensamento clara e racional, pois o homem já nasce confuso — uma herança genética, talvez. Seu desejo pelo supérfluo chega a ser constrangedor quando comparado às coisas realmente relevantes para sua existência. Não consegue tomar decisões simples sem longas reflexões e, ainda assim, costuma escolher a pior opção possível. Desejar se tornou hábito, mas planejar e agir para conquistar o que se ambiciona continua sendo exceção. Aos poucos, o indivíduo absorve as leis, os gostos e os pensamentos dos outros porque não conhece a si mesmo. Vive à sombra dos que o cercam, incapaz de sustentar sua própria vontade, abandonando ideias racionais por falta de apoio externo. O filósofo chinês Lao Tsé escreveu pensamentos simples e óbvios: um copo s...

As modernas relações humanas

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  As relações humanas sempre foram objeto de reflexão filosófica ao longo das gerações. Pensadores de diferentes culturas buscaram compreender seus mecanismos, suas fragilidades e sua importância para a vida em sociedade. Contudo, ao observarmos o presente, parece que elas não evoluíram com o tempo. Pelo contrário: quanto mais o ser humano se desenvolve social e cientificamente, mais tensas e frágeis se tornam suas conexões. Talvez seja uma característica intrínseca da nossa natureza, mas é evidente que a dificuldade de se relacionar cresce na mesma proporção em que avançam a tecnologia, a fisiologia e a psicologia. Vivemos um crescimento tecnológico sem precedentes, capaz de aproximar pessoas em segundos. Telefones inteligentes, redes sociais e a globalização da internet criaram pontes que poderiam fortalecer laços. Entretanto, paradoxalmente, quanto mais aumenta o poder de comunicação, mais cresce a sensação de solidão e o egoísmo. A mesma ferramenta que permite o encontro também...

Terceira Via

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Eis que nos deparamos com uma encruzilhada. À nossa frente, dois caminhos: o da esquerda e o da direita. Muitos escolhem aleatoriamente e seguem sem grandes preocupações. Outros, mais cautelosos, ficam conjecturando, planejando e medindo as opções com minúcia. A escolha, seja qual for, exige envolvimento e responsabilidade. Afinal, é por meio delas que chegamos aos lugares onde estamos — bons, ruins ou apenas medianos. Não há como prever quantas vezes nos veremos diante de uma bifurcação ao longo da vida. E isso, longe de ser um problema, pode ser uma dádiva. Se seguíssemos apenas em linha reta, veríamos o que há à frente com antecedência, o que reduziria a chance de surpresas. Mas são justamente as surpresas que nos mantêm atentos, despertos, vivos. Elas exigem preparo, presença e coragem. Imaginemos, por exemplo, os relacionamentos amorosos. À nossa frente, duas figuras: uma pessoa que nos ama e outra por quem estamos apaixonados. Às vezes são a mesma, mas frequentemente não. A prime...

Vaidade

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A vaidade é, talvez, a característica mais notória dos seres humanos. Até os atos mais simples carregam em si algum traço de vaidade. No entanto, ela é frequentemente criticada, marginalizada e incompreendida por aqueles que a atacam. O olhar comum costuma reduzi-la à dimensão física, ao consumismo ou ao exibicionismo: demonstrações desnecessárias de beleza, ostentações exageradas de riqueza. Mas a vaidade é muito mais do que isso. Ela é, em essência, a razão de ser de uma pessoa. Um indivíduo sem vaidade seria desinteressante, jogado ao acaso, sem nada a oferecer aos outros ou a si mesmo. Quem não aprecia a vaidade não pode ostentar cultura, compreender a arte ou mesmo a ciência. Afinal, desde o cozinheiro que prepara pratos elaborados, passando pelo músico que compõe melodias e as executa com perfeição, até as mãos hábeis de um grande cirurgião, todos são movidos pela vaidade. Seja intelectual, profissional ou física, a vaidade é motor das grandes conquistas humanas — e também de seu...

Conceito de arte

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Esta é minha primeira postagem neste blog, e pensei bastante sobre o que escrever para inaugurá-lo. Muitas ideias vieram à mente: poderia falar da minha banda, dos livros que tenho lido, dos seriados que acompanho, dos filmes que me marcaram ou até do meu trabalho como assistente administrativo. Mas o tema que prevaleceu foi o conceito de arte. Não me refiro à arte em si, nem a um tipo específico, mas ao conceito que define a alma de um artista — algo bem mais complexo do que comentar um filme, um disco ou um livro. Tento aqui ilustrar a manifestação genética, o DNA do artista. Talvez seja abstrato demais tentar distinguir um artista genuíno — aquele que transforma tudo o que toca em arte — de um profissional da arte, como um fotógrafo, um ator de novelas, um músico de estúdio ou um artista plástico que vende obras sob encomenda. Ainda assim, acredito que existam peculiaridades psicológicas e morais que ajudam a definir que tipo de artista cada pessoa é. Talvez viver seja uma luta cons...